O Susto na Praça Sombria

por Sílvia Hermida

Praça Central decorada para o Halloween, lanternas e abóboras iluminadas
A Praça Central de Nova Esperança — início da Festa de Halloween.

A Praça Central da pequena cidade de Nova Esperança tinha se transformado. As luzes de LED vibrantes da rotina foram substituídas por um brilho alaranjado e roxo, emanado de lanternas de abóboras disformes e globos de luz piscantes. Teias de aranha falsas, cuidadosamente esticadas por cima de árvores centenárias, balançavam levemente com a brisa fria da primavera, e esqueletos de plástico pendurados pareciam rir silenciosamente de um pedestal. Era a Festa de Halloween da cidade, e Alice, Helena, Pedro e Enzo estavam prontos para a diversão, eram amigos desde sempre, inseparáveis.

Alice estava irreconhecível em sua fantasia de vampira gótica, com lábios roxos e uma capa esvoaçante. Helena, vestida como uma bruxa chique, com um chapéu pontudo e botas de salto, agarrava-se ao braço de Alice, apesar de garantir que não estava nem um pouco assustada. Pedro, um lobisomem com orelhas peludas e dentes protéticos, tentava flertar com as meninas, enquanto Enzo, o mais cético do grupo, usava uma simples máscara de fantasma e parecia entediado.

― Qual é, gente? disse Enzo, revirando os olhos por trás das aberturas da máscara ― o mais assustador aqui é a playlist de músicas que toca há duas horas. Onde está o mistério?
― Não seja estraga-prazeres, Enzo, ― replicou Helena, dando-lhe um beliscão no braço. ― O ambiente está incrível. Sinto que algo pode acontecer.

Mal as palavras saíram de sua boca, um estrondo seco ecoou, abafando a música. Olharam em direção ao centro da praça. A estátua do fundador da cidade, um busto de pedra que pairava sobre um pilar de concreto, parecia ter perdido algo. No chão, aos seus pés, estava a placa de metal com o nome do homenageado, que acabara de cair.

― Uau, que sorte. O prego quebrou ― comentou Pedro, tentando soar casual enquanto olhava ao redor, notando que todos na festa também tinham se virado para o busto.

No entanto, o inesperado continuou. Um segundo depois, a única vela que iluminava a abóbora mais próxima a eles se apagou de repente, embora não houvesse vento. E, imediatamente, o busto de pedra do fundador da cidade pareceu... mover. Não, não a estátua inteira, mas os seus olhos. Por um momento que pareceu uma eternidade, os quatro juraram ter visto os olhos de pedra da estátua piscarem lentamente e, em seguida, voltarem a encarar o vazio.

Estátua antiga iluminada por velas, olhos de pedra brilhando sob a névoa
Os olhos de pedra do fundador pareciam observá-los.

Helena soltou um grito abafado, e até mesmo Alice, que era a mais corajosa, sentiu um arrepio gelado subir pela espinha.

― Viram isso? ― sussurrou Alice, sua voz tremendo ligeiramente.
― Eu... Eu devo estar imaginando coisas ― gaguejou Pedro, seu rosto de lobisomem agora pálido.
― Isso não foi a música, nem o vento. Aquela coisa olhou para a gente! ― exclamou Enzo, tirando a máscara.

Neste momento, a música parou abruptamente. O silêncio que caiu sobre a praça foi mais aterrorizante do que qualquer som. De repente, a fileira de abóboras que ladeava o caminho para o coreto começou a acender e apagar em um ritmo errático, rápido e hipnótico, parecendo sinais de código misteriosos.

Então, eles ouviram. Não era um grito, nem um assobio, mas uma risada. Uma risada rouca, vinda de lugar nenhum e de todos os lugares ao mesmo tempo, que parecia zombar deles e de todo o medo que sentiam. A risada ecoou pela praça, fazendo as folhas secas no chão farfalharem como sussurros.

Os quatro se entreolharam, o pânico tomando conta. A diversão tinha acabado. A decoração de Halloween da cidade, de repente, parecia perfeitamente real.

― Vamos embora! AGORA! ― gritou Alice.

Sem dizer mais nada, os quatro amigos correram. Não olharam para trás, tropeçando um no outro em meio às teias de aranha e aos enfeites. A risada parecia persegui-los, até que, finalmente, atravessaram a linha da praça e caíram na rua iluminada, onde as luzes de neon das lojas os acolheram com um alívio súbito e reconfortante.

Pararam para recuperar o fôlego, o coração batendo descontroladamente.

― O que... o que foi aquilo? ― ofegou Helena, com o chapéu de bruxa torto.
― Eu não sei, mas não foi uma 'pegadinha' de Halloween ― respondeu Enzo, ainda chocado.

Enquanto se afastavam, deixando a praça sombria para trás, a placa de metal com o nome do fundador na praça começou a deslizar lentamente pela base do pedestal, até se encaixar perfeitamente no lugar, como se nunca tivesse caído. E na escuridão da praça, entre as abóboras que agora brilhavam com uma luz fixa, a risada parou, sendo substituída por um silêncio assustador, esperando pela próxima vítima.

Os quatro amigos tinham descoberto que, em Nova Esperança, o espírito de Halloween era muito mais real e inesperado do que eles jamais poderiam ter imaginado. E, com certeza, nunca mais olhariam para a estátua do fundador da cidade da mesma maneira.

Rua vazia à noite com luz de poste e sombra misteriosa ao fundo
Os ecos do terror pareciam segui-los pelas ruas vazias.

Enquanto caminhavam apressadamente pelas ruas residenciais, o som dos seus passos ecoando no asfalto frio. O alívio de ter saído da praça era palpável, mas uma camada pegajosa de medo persistia.

― Vocês acham que foi... sei lá... o zelador da cidade nos pregando uma peça com efeitos de som e luz? ― tentou racionalizar Pedro.
― O busto piscar? E aquela risada? Não era gravada, Pedro. Parecia... profunda. E estava perto ― respondeu Enzo, sua descrença habitual completamente desfeita.

Alice, com a capa de vampira apertada ao corpo, mantinha os olhos fixos na frente.

― Não importa o que foi. O importante é que estamos longe. É melhor irmos para casa e fingir que esta noite nunca aconteceu.

Helena anuiu, tremendo.

― Concordo. Nunca mais vou a uma festa na Praça Central em 31 de outubro.

Eles chegaram à esquina da casa de Alice. A rua estava estranhamente quieta. As luzes da varanda estavam acesas, mas a escuridão da noite parecia engolir os arredores.

― Pronto, estou em casa ― disse Alice, respirando fundo. ― Vocês querem entrar? Podemos ver um filme e tentar esquecer...

Foi então que um som sutil, quase inaudível, capturou a atenção de Enzo. Era um farfalhar seco. Não vinha das árvores, mas do chão, perto de onde eles estavam parados.

― Silêncio ― murmurou ele, levantando a mão.

O grupo parou, tenso. O som repetiu-se: fsssh... fsssh... Como se algo estivesse sendo arrastado lentamente sobre as folhas caídas, mas sem o peso de um pé.

― Ali... ― apontou Pedro.

Na semiescuridão, eles distinguiram uma sombra movendo-se. Não era um animal. Era algo alongado e curvo, deslizando. Conforme se aproximava da luz fraca do poste, a forma tornou-se mais clara, e o estômago de Alice gelou.

Era uma teia de aranha. Não era uma teia falsa de decoração; era uma teia grossa e cinzenta, pesada com orvalho da noite. Mas o aterrorizante era que a teia estava se movendo sozinha. Ela parecia flutuar no ar a alguns centímetros do chão, sendo puxada por uma força invisível, arrastando as folhas e sujidade para criar um rastro. A teia deslizou até parar exatamente aos pés de Helena.

Helena soltou um grito estrangulado e deu um salto para trás, caindo nos braços de Pedro.

Enzo, pálido, percebeu algo mais. Preso no centro da teia, havia algo pequeno e brilhante que não deveria estar ali: o botão da fantasia de vampira de Alice, um pequeno e prateado ornamento que ela havia perdido ao correr da praça.

A teia parou. O movimento cessou. O silêncio voltou, mas agora estava preenchido pelo som ofegante da respiração dos quatro.

Enzo aproximou-se devagar, os olhos fixos no botão.

― Não é possível... Corremos o quarteirão inteiro. Como... como isto chegou aqui tão rápido?

Ele esticou a mão hesitante para pegar o botão. No momento em que os seus dedos tocaram o fio pegajoso, o ruído agudo e estridente de um motor de cortador de grama, que parecia estar sendo ligado diretamente aos seus ouvidos, irrompeu do quintal escuro de Alice.

Não era um cortador de grama normal. O som era distorcido, alto demais, quase metálico. E não parou; começou a acelerar, subindo de tom num ruído ensurdecedor que parecia vibrar nos seus ossos.

Os quatro taparam os ouvidos. Alice cambaleou para a porta, pegando a chave com as mãos trêmulas.

― Para dentro! Rápido! ― gritou ela, mal ouvindo a própria voz.

Eles se empurraram para dentro da casa, batendo a porta e trancando-a com dois giros rápidos da chave. O som do motor ainda perfurava o ar, vindo do lado de fora.

A luz da sala de estar parecia fraca, mas segura. Os quatro se encostaram na porta, ofegando.

― Aquele som... o botão... está nos seguindo! ― ofegou Helena, lágrimas nos olhos.

De repente, o som do cortador de grama, que estava no auge do seu volume, parou. O silêncio era um alívio, mas um presságio.

Os amigos ficaram em silêncio por um minuto. Então, um clique suave e inconfundível veio da parte de trás da casa. Era o som da porta do jardim de Alice, que estava trancada, sendo destrancada. Lentamente.

E, a seguir, um som mais pesado, abafado pelo carpete, mas que não deixava margem para dúvidas. Passos. Passos firmes e lentos, vindos da cozinha em direção à sala de estar.

O terror gelou o sangue dos quatro, que ficaram paralisados. O horror na praça era brincadeira de criança comparado ao que parecia ter entrado em sua casa. A sombra que avançava pelo corredor não era mais a de um truque de luz. Era alta, imponente, e, conforme se movia, o aroma inconfundível de terra molhada e abóbora podre preencheu o ar.

Eles não precisavam ver. Eles sabiam. O que quer que fosse que os havia assombrado na Praça Sombria, tinha-os seguido até casa. E estava a poucos metros de distância.

Fim.